02 mar A Diversidade como norteadora de criação e escala de comunidades
Artigo por: Thierry Cintra Marcondes | Foto: Banco de Imagens.
Comunidades e ESG (no português ASG) são dois dos temas mais discutidos na atualidade e extremamente importantes para o futuro da nossa sociedade. Não é novidade que se não mudarmos nossas práticas teremos vários problemas. Dentro da sigla ESG, temos E de Environmental (meio ambiente), S de Social, e G de Governance (governança). Sobre essa última, tem se falado muito de Diversidade, que é um elemento extremamente poderoso.
Sabemos a importância de uma comunidade. Ela promove conexões, compartilhamento de conhecimentos e informações. Comunidades como B2Mamy, Confraria do Empreendedor, ZeroOnze, San Pedro Valley, entre outras, têm promovido muito mais do que conexões e apoio, também promovem negócios. Isso demonstra a importância da criação de comunidades e o ESG deveria fazer parte desse processo, em especial com o tema da diversidade como norteador.
Segundo a Associação Brasileira de Startups (ABS), sete elementos são importantes na construção de um ecossistema ou comunidade de startups. Todos estão contemplados na lista abaixo, mas têm graus de importância que complemento, de acordo com minha experiência, produzindo uma nova ordem, na qual destaco a diversidade como a primeira da lista:
- Diversidade e impacto;
- Cultura;
- Talento;
- Densidade;
- Acesso a mercado;
- Acesso a capital;
- Ambiente regulatório.
Seja em comunidades iniciantes e principalmente comunidades mais maduras, a diversidade deve ser o principal pilar, pois ela cria, acelera e amplifica todos os demais elementos, sendo um norteador para todos os outros pilares. Dou exemplos:
A cultura é o elemento mais importante em qualquer atividade e projeto, seja na criação de uma startup ou comunidade. É a cultura que definirá o propósito e o norte a ser seguido, definirá os rituais e as boas práticas. Uma comunidade e até startup com uma cultura ruim ou não bem estruturada está com seus dias contados.
Porém, desenhar uma cultura sem pensar na diversidade desde o início é como construir uma linda casa sem acessibilidade. Seriam necessárias várias “reformas” e “remendos” que sairiam muito mais caros, seriam demorados e não ficariam tão bons quanto se fossem contemplados no projeto estrutural desde o princípio.
As comunidades que não incorporaram a diversidade na sua origem terão muita dificuldade em mudar esse ponto. Uma forma de tentar minimizar é dar voz para pessoas de diversidade, tendo uma “cota” para que elas possam se apresentar em palestras, escrever, criar grupos de trabalho para entender as dores, mas isso não é igual a já começar com a “diversidade no DNA”.
Pensando em diversidade você cria, promove e incentiva uma cultura mais acessível e inclusiva, que torna a comunidade muito maior e impactante. Nesse movimento, mais pessoas se sentem acolhidas e representadas e, com isso, compartilham diferentes formas de conhecimentos e percepção de problemas. Consequentemente, outras soluções e ideias serão pensadas de forma a representar mais ainda as pessoas e atrair outras, dispostas em ajudar a comunidade.
Mais representatividade nas comunidades faz com que mais pessoas se engajem, promovendo maior formação de talentos e capacitações. Quando a cultura e diversidade andam juntas, conhecimentos e materiais de formações mais acessíveis e inclusivos também são feitos, entendendo o que os usuários da comunidade de fato precisam.
Existem poucos materiais disponíveis e a preços acessíveis para pessoas cegas (seja em audiodescrição, sites acessíveis ou até braile), para pessoas surdas (vídeos legendados e com intérprete de libras ou até livros em libras), ou livros com linguagem mais acessível (com menos jargões ou termos em inglês), mas isso pode mudar se pensarmos a Diversidade como estrutura da comunidade.
Assim, geramos um círculo virtuoso. Com mais engajamento ou até mais conteúdos acessíveis permitimos que mais pessoas sejam capacitadas e apoiadas, gerando novos colaboradores para trabalhar nas startups, players do ecossistema e, posteriormente, virarem fundadores e empreendedores. A falta de engajamento e capacitação se dão por falta de representatividade e acessibilidade.
Com isso, naturalmente teríamos maior densidade, mais membros se juntando, mais pessoas se voluntariando para ajudar as comunidades, mais pessoas se voluntariando como mentores, formando hubs ou clusters de inovação, possibilitando o surgimento de novos negócios, além de negócios com propósito e impacto.
Isso provocará uma maior maturidade no ecossistema e maior acesso ao mercado. As empresas, sejam grandes, médias, pequenas e até as próprias startups estarão muito mais dispostas e abertas para colaborarem entre si e fazerem negócios. O preconceito será reduzido por parte das empresas e mais conexões serão feitas entre os atores do ecossistema.
Mais do que isso, promovendo a diversidade, novas maneiras de enxergar problemas serão identificadas ou problemas que antes não mereciam a devida atenção serão percebidos, criando novos mercados e soluções.
Duas comunidades bem estruturadas, como a Confraria do Empreendedor e a B2 Mamy, mostram exatamente isso. A B2 Mammy, que é primeira empresa de educação digital que capacita e conecta mães ao ecossistema de inovação e tecnologia para que sejam líderes e livres economicamente. Desde 2016, apoia o desenvolvimento de negócios inovadores fundados e liderados por mães, capacitando mais de 30 mil mulheres nos programas de educação e movimentando mais de R$6 milhões dentro da rede.
Já a Confraria do Empreendedor tem sido um ponto forte na conexão. Graças a uma cultura de propósito, give back e o tamanho da diversidade dessa rede, tem sido possível acessar quase qualquer pessoa do Brasil e até do mundo em poucos segundos. Outro ponto de destaque é a criação de novos negócios, graças à diversidade da rede. O caso mais interessante foi da Octa, onde o Arthur Rufino CEO da Octa se juntou com a Fisher (venture builder financeira).
Com mais projetos andando e casos formados, maior será o acesso a capital. Os investidores entenderão melhor novas dores, com novos potenciais de mercado tornando investimentos mais interessantes, fora que a comunidade é capaz de criar todo um ecossistema para apoiar e gerar consumo.
O ambiente regulador seria importante no final para ajudar a fomentar e acelerar novas startups e conexões com empresas. Podendo inclusive ajudar os empreendimentos que trazem soluções de maior impacto para a sociedade, em especial impactos socioambientais.
Como podem ver, a diversidade não é somente uma grande faísca ou pilar, mas, sim, gera uma grande explosão para que gerações de comunidades consolidadas sejam formadas e os principais problemas da sociedade possam ser resolvidos.
Thierry Cintra Marcondes é conselheiro do Unicamp Ventures. Engenheiro mecânico formado pela Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp (FEM) e fundador da empresa-filha Evolucar. Ele foi vencedor do Desafio Unicamp de 2012. Além disso, é criador do movimento Empatia do Silêncio, que tem como objetivo conscientizar a sociedade em relação à deficiência auditiva.